Entrevista: Maria Angélica Delwide, assistente social
- Diário de Adoção
- 12 de jan. de 2018
- 6 min de leitura
Atualizado: 25 de jan. de 2018
Especialista em Serviço Social Forense e formada pela PUC, a especialista tirou algumas dúvidas sobre a adoção.

O Diário de Adoção, buscando entender um pouco como funciona o processo da adoção, preparou uma entrevista com a assistente social forense Maria Angélica Delwaide. Na entrevista, ela tira algumas das dúvidas sobre a parte técnica da adoção. Você confere a entrevista na íntegra abaixo.
Diário de Adoção (DA): Quanto tempo normalmente dura o processo de adoção?
Delwaide: O processo todo até a concretização da adoção, em média cinco anos. Mas a nova lei de adoção de 2017 pretende com suas modificações reduzir esse prazo, para que a criança fique menos tempo em abrigos.
DA: Como funciona o processo de adoção tardia?
Delwaide: O processo de adoção tardia é igual ao outro processo. O que há de diferença é que o perfil do casal ou da pessoa que deseja adotar aos poucos está mudando. Tardia porque a maioria dos pretendentes querem adotar crianças até dois anos de idade.
A adoção é uma forma de garantir os direitos da criança e adolescente resguardados pelo ECA e uma oportunidade dos mesmos crescerem pertencendo a uma família, com a garantia de que irão receber carinho, amor, estudo, lazer, cuidados com a saúde e principalmente que poderão se expressar como um sujeito de direito sobre suas escolhas e o que desejam pra si.
DA: Algumas pessoas tem medo de adotar crianças mais velhas por medo delas serem “mais problemáticas”: existe alguma verdade nesse pensamento, ou é apenas um medo não justificado?
Delwaide: Os pretendentes acreditam que as crianças mais velhas e os adolescentes tragam consigo uma série de “vícios”: má educação, falta de limites e dificuldades de convivências. Pensam ser impossível criar vínculo afetivo entre eles; pois já podem saber que não pertencem à família biológica e sim a uma adotiva. Outra crença é: podem querer conhecer ou rever a família biológica e resultar em fuga do filho adotivo. O que pode acontecer é a devolução da criança/adolescente ao abrigo alegando que não houve a adaptação entre eles.
Por isso a importância dos cursos oferecidos pelo judiciário aos pretendentes à adoção, para que possam adquirir estrutura emocional capacitando-os para adotar crianças/adolescentes em “idade tardia”. Pessoas com o suporte técnico ao seu dispor, dificilmente devolvem às crianças que pretendiam adotar, com idade acima de dois anos. Portanto o medo de adotar crianças mais velhas é um medo não justificado, que aos poucos está sendo abolido por parte dos pretendentes.
DA: Como funciona a Destituição do Poder Familiar?
Delwaide: A Destituição do Poder Familiar é a perda do poder familiar é o tipo mais grave determinada por decisão judicial, definida no artigo 1.638 do Código Civil, que tem como hipóteses para a sua configuração: o castigo imoderado ao filho, o abandono, a prática de atos contrários à moral e aos bons costumes e o fato de, um genitor ou ambos, reincidirem por vezes no abuso de suas autoridades, faltando aos deveres que lhes cabem ou arruinando os bens dos filhos. O juiz pode passar a guarda da criança/adolescente à um parente, ou o Ministério Público adotar a medida necessária para a segurança do menor. O Estado intervém quando necessário para a garantia do bem-estar e do interesse daqueles em situação de risco psicológico, físico ou social. Por isso os magistrados podem se amparar em estudos e profissionais de outras áreas tais como: pedagogos, psicólogos e assistentes sociais.
DA: Como funciona a adoção internacional?
Delwaide: A adoção internacional no Brasil disponibiliza a adoção de crianças brasileiras por estrangeiros, de brasileiros residentes no exterior e de brasileiros residentes no Brasil que queiram adotar crianças estrangeiras; através do Estatuto da Criança e do Adolescente e do Acordo internacional de Haia – Convenção de Haia.
Quando se trata de adoção de brasileiros adotantes de crianças estrangeiras torna-se difícil encontrar países que estejam abertos para aceitar adoção internacional de suas crianças.
A adoção internacional de crianças brasileiras acontecem através de processos bem estruturados, estudados e analisados pelas CEJAI’s espalhadas em praticamente todos os estados brasileiros, sendo elas, as comissões, às principais responsáveis pelo sucesso de tais adoções internacionais.
Diversos países estrangeiros não aceitam a adoção internacional de suas crianças como também não fizeram parte da Convenção de Haia, e também sequer possuem legislação específica para o tema: Adoção Internacional o que torna a adoção de crianças estrangeiras por brasileiros um grande obstáculo.
O Chile é exemplo de país participante da Convenção de Haia, portanto aberto à Adoção Internacional de suas crianças e permite inclusive que os processos sejam tratados e processados unicamente pelas autoridades centrais dos países envolvidos.
A outra forma de Adoção Internacional é quando o postulante é residente ou domiciliado fora do Brasil, conforme a Convenção de Haia e o Estatuto da Criança e do Adolescente. Para tanto o juiz determinou que a colocação da criança em família substituta é a solução mais adequada ao caso concreto. Que foram esgotadas todas as possibilidades da colocação da criança ou adolescente em família substituta brasileira, após consulta aos cadastros pelo setor técnico do judiciário. No caso de adoção de adolescente, o mesmo será consultado do desejo de ser adotado e subsidiado por um relatório da equipe técnica do judiciário, equipe do abrigo onde está acolhido e equipe técnica do CREAS.
Os brasileiros residentes no exterior têm preferência aos estrangeiros, para a adoção internacional de criança ou adolescente brasileiro.
Quem atua nesse tipo de processo são as autoridades centrais estaduais e federais.
O postulante interessado em adotar crianças brasileira faz o pedido de habilitação à autoridade central, no Brasil. A Comissão Estadual Justiça de Adoção Internacional CEJAI emitirá um relatório caso entenda que o postulante está habilitado a adotar. O juiz determina um estudo psicossocial da criança/adolescente a ser adotado, dentro do estágio de convivência entre eles.
Para esse tipo de adoção geralmente estão disponibilizadas crianças acima de seis anos com grupo de irmãos mais novos ou mais velhos que ela.
Existem agências internacionais que intermediam os estrangeiros para que tal adoção possa ser efetivada.
Nos anos em que atuei no judiciário lembro de ter trabalhado com agências dos Estados Unidos da América e da Itália.
DA: Com a mudança na legislação que rege o processo de adoção, dando prioridade para certos candidatos e crianças aptas à adoção, além das outras mudanças efetuadas, o tempo de espera deve diminuir? Na prática, quais são os efeitos dessas mudanças?
Delwide: Na prática os efeitos dessas mudanças só terão resultados positivos se o perfil dos postulantes for mudado. A demora em adotar ocorre, porque a maioria dos casais preferem bebês para tê-los como filhos legítimos e criá-los desde pequenos. Mudando a idade, o sexo, a cor, a religião, os processos ocorrem com maior rapidez.
DA: Como funciona a adoção por casais homossexuais? Existe alguma dificuldade no procedimento, que não exista nas adoções heterossexuais?
Delwaide: O procedimento da adoção por casais homossexuais é igual aos outros casais ou pessoas que pretendem adotar, sem nenhuma dificuldade. O único cuidado que se toma é na entrevista psicológica: recebem orientação devido ao preconceito existente, para que a criança em idade escolar não sofra bullying.
Eu em particular não atuei em nenhum processo com a entrega de crianças para pretendentes heterossexuais. Atuai na habilitação de pretendentes do mesmo sexo e apenas de casais do sexo feminino.
DA: Caso o filho adotivo queira conhecer os pais biológicos, como ele deve proceder? Existe algum procedimento que facilite esse contato?
Delwaide: O setor técnico sempre orienta os pretendentes que desde a tenra idade conte aos filhos que são adotivos; pois faz parte da história de vida deles e assim não deve causar nenhum trauma aos adotivos, fortalecendo desta forma o vínculo afetivo entre os pretendentes e àqueles que estão sendo adotados.
É muito comum que esse desejo apareça a partir dos 12 ou 13 anos. É o período em que o indivíduo está construindo a sua identidade e quando questões mais profundas vêm à tona. Nos adolescentes a vontade de conhecer os pais biológicos vem acompanhada do medo e da insegurança. Os pais adotivos se sentem um pouco desconfortáveis nessa situação. Ficam com medo também que os pais biológicos possam rejeitar mais uma vez o filho em questão e que não saiba, o filho, lidar com isso. Mas os pais adotivos devem apoiar o desejo do filho. Hoje em dia existem as redes sociais para fazer a busca e também entrar com uma petição no fórum deve ajudar o filho desvendar o mistério. Os pais adotivos devem preparar o filho para todo o tipo de reação do reencontro com a família biológica, que se for um encontro negativo pode ser doloroso e traumático para o filho.
Pela lei de adoção 12.010/09 o direito de conhecer a origem biológica passou a fazer parte do artigo 48 do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90), que pode ser revelado até antes de completar 18 anos de idade, através da Vara da Infância e da Juventude, onde o juiz nomeará um psicólogo e um advogado para o menor em questão. O filho adotivo tem o direito de ver todo o processo onde foi realizada a adoção.
DA: Aliás, se tratando de pais biológicos, eles podem mudar de ideia após a adoção e solicitar a reintegração da guarda da criança pedindo o filho de volta?
Delwaide: A família biológica tem o direito de buscar a permanência da criança em seu lar e, para isso, é preciso garantir todos os prazos para se defender das acusações feitas contra ela.
Em alguns casos, a família consegue adquirir condições para recuperar a guarda do filho, o que novamente deve ser analisado pelo juiz na revisão do caso, restabelecendo o poder familiar, desde que os pais demonstrem que foram cessadas as causas que levaram à destituição, que a criança e ou adolescente não tenha sido adotado e que a medida atenda o melhor interesse da criança, de modo a garantir o direito de serem criados e educados na sua família biológica.
Por Thaís Fritoli - Diário de Adoção
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