Relato: Marcio Antonio, meu pai adotivo
- Diário de Adoção
- 23 de jan. de 2018
- 3 min de leitura
Atualizado: 25 de jan. de 2018
"Não vai ter uma criança loirinha de olhos azuis e rostinho rosadinho, mas com amor ela acaba ficando assim."
O relato abaixo foi enviado pelo meu pai, após solicitado pessoalmente. O texto foi modificado para compreensão, porém segue fiel ao conteúdo disponibilizado. Todas as fotos foram retiradas do meu álbum de família, do meu primeiro ano de vida.

Acervo Pessoal: Fotos de Thaís e Marcio. Quando pequena e quase vinte anos depois. A foto superior é a do relato enviado, escrito a mão pelo meu pai.
A história
Desde pequeno, sempre gostei de crianças, então o sonho de ser pai sempre esteve presente na minha mente e no meu coração. Fácil: Encontra-se uma parceira, monta-se uma casa, dá um tempinho, deixa as coisas andarem e o filho nasce. Pronto, um lar. Só que as coisas não foram bem assim. A parceira, a casa e o tempinho, isso estava tudo em ordem, mas nada de filho.
Então, exames, hospitais, médicos e consultas, tudo para tentar descobrir o que causava essa situação. Descobrimos, assim, que não seria possível conceber um filho biológico, pois sou estéril.
Através de inseminação artificial, até seria possível, mas sairia muito caro e não era algo certo. Então, em comum acordo, decidimos: vamos adotar.
Em busca da adoção
Na época, morávamos em Miracatu, Vale do Ribeira, estado de São Paulo, região muito pobre, e começamos a visitar fóruns e maternidades da região. Coincidentemente, o Governo tinha acabado de lançar um programa novo para facilitar o processo e fomos um dos primeiros nomes a serem inscritos.
Surgiram várias possibilidades e visitas à famílias com crianças para possível adoção, mas não era muito fácil, pois as mães não queriam entregar as crianças sem uma ordem judicial.
Antes de adotarmos a Thaís, conhecemos uma outra criança, que apelidamos de "Cinderelo". Ele morava com a sua família depois do fim de uma estrada, numa casinha à beira de um rio. Sua mãe tinha oito filhos, sendo que a mais velha tinha somente 8 anos.
Eles viviam em uma tremenda dificuldade de sobrevivência, mas mesmo assim a mãe não quis dar a criança para adoção. Meses mais tarde, recebemos a notícia de que o menino, "Cinderelo", não resistiu e acabou falecendo devido a desnutrição extrema.
A adoção
Nesse tempo, mudei de profissão e voltei a morar, com a minha esposa, em Mogi Mirim. Certo dia, uma amiga nossa do fórum de Miracatu ligou, dizendo que havia surgido uma criança disponível para adoção. No mesmo dia, fomos para Miracatu e, de lá, seguimos para a casa da família, sempre acompanhados de uma assistente social.
Mais uma vez, bem longe da cidade, uma estrada rural que vai se afunilando e não chega. Na casinha de barro, à beira de um riozinho, estava lá uma menininha, em um "bercinho" de caixa de banana, só com a parte de cima da roupa, bem sossegada.
Prontamente, a mãe a vestiu e fomos para o fórum, aonde o promotor, ao perceber a situação, prolongou seu expediente e nos deu a certidão de guarda provisória da Elisângela, que, posteriormente, se tornaria a nossa querida filha Thaís. Então eu me tornei pai.
Atualmente
Muita coisa nesse tempo ficou sem relatar, por exemplo, as nove pneumonias da Thaís e o coração do Marcinho (meu outro filho, também adotivo), mas uma coisa eu quero dizer: A poucos quilômetros da maior cidade da América do Sul há muita pobreza e uma precária condição de sobrevivência que está muito longe de "qualidade de vida" e dignidade.
Quem estiver pensando em adotar: não desista. O processo é mesmo assim. Não vai ter uma criança loirinha de olhos azuis e rostinho rosadinho, mas com amor ela acaba ficando assim. E até se formar dá trabalho igual ao filho biológico, mas vale muito a pena.
Marcio Antonio, meu pai, para o Diário de Adoção.
Que história linda! Me emocionei :')